A verdadeira história de Chapeuzinho Vermelho


Uma vez, a muito tempo atrás - nem sei quanto tempo -, a mãe da minha tataravó deu a ela uma linda capa vermelha, que depois foi dada para minha avó, depois para minha mãe e depois para mim.

Minha avó veio de muito longe com um monte de pessoas num navio; ela falava engraçado porque teve que aprender nossa língua quando tinha mais ou menos doze anos - ela sempre tentou me ensinar a língua que ela falava antes de vir pra cá, mas eu nunca consegui aprender.

Quando estávamos somente nós duas, ela me chamava de petite fille - eu gostava porque sempre soou muito carinhoso - e também me contava muitas histórias. Uma delas fez meus colegas rirem de mim na escola, quando a professora a contou errado para nossa classe e eu disse que não tinha sido daquele jeito porque minha tataravó tinha contado para minha avó que depois contou para mim - agora nem ligo mais, mas na época eu lembro que chorei muito em casa.

A história era assim: certa vez, a avó da minha tataravó pediu para a filha dela levar umas coisas, em uma cesta de piquenique, para uma tia que estava adoentada do outro lado da floresta - acho que naquela época não era como hoje, em que as crianças não podem mais sair nas ruas por causas de perigos e tudo o mais.

Estava muito frio, por isso, além de uma roupa bem quentinha, a mãe da minha tataravó também levou uma capa vermelha com um capuz. E assim ela foi pelo chão que parecia uma enorme folha de papel em branco, pois havia nevado muito na noite anterior.

Quando chegou na metade do caminho viu que, mais a frente, havia uma "alcateia" - se você não sabe o que é uma alcateia, vale pena te dizer: é um bando de lobos - e que, pela carinha deles, parecia que não haviam comido a dias. Por causa disso ela abre a cesta que estava carregando, pega alguns sanduíches e jogas para eles, na esperança de que não fossem atrás dela. Os lobos avançam, desesperados.

- Quem é você, menina? - Pergunta o maior lobo do bando, após devorar um sanduíche inteiro.

- Mamãe sempre diz para não falar com estranhos. - Responde a mãe da minha tataravó.

- Sábio conselho. - Responde o lobo. - Por você ter jogado comida para nós, não a incomodaremos, contudo, tome cuidado! O cheiro que vem dessa sua cestinha é maravilhoso e ele pode atrair outro de nossos irmãos.

Ela agradece e continua andando, até sentir que alguém a observava.

- Quem está ai?! - Pergunta ela, assustada.

Então, do meio de uns arbustos cobertos por neve surge outro lobo, bem menor que aquele que havia conversado com ela, porém, bem mais faminto.

- Garotinha de chapéu vermelho, onde você vai com essa deliciosa cesta? - Pergunta o lobo.

- Vou para a casa da minha tia, que não está passando muito bem. - Responde ela.

- Ora! Eu se fosse você não andaria sozinha por esta floresta. - Torna a dizer o lobo, fazendo com que a mãe da minha tataravó simplesmente virasse as costas para ele e continuasse seu caminho.

Ela havia ficado completamente apavorada, tanto que nem percebeu que, de longe, o lobo a acompanhava.

Ao chegar na casa de sua tia, a mãe da minha tataravó entrega a cesta e ambas sentam-se na mesa, para comer. Quando estavam quase terminando o último doce de uva, escultam um uivo - lembrando que o uivo é um longo grito de dar medo que os lobos dão quando é noite de lua cheia - e, através da janela, entra o mesmo lobo que a havia seguido.

As duas se desesperam e começam a jogar tudo o que vinham pela frente naquele lobo faminto, enquanto ele tentava avançar em cima das duas. 

Quando tudo parecia perdido, ou seja, quando não havia mais nada para ser jogado, o lobo caminha lentamente para cima delas e, quando ele ia atacá-la... "Crack!", por outra janela entra um lobo enorme e o ataca, o mesmo lobo grande do bando que havia ganhado os sanduíches.

O lobo pequeno resiste bravamente, mas por causa de seu tamanho, acaba perdendo.

- Eu só estava com fome! - Diz o lobo perdedor ao que havia ganhado.

- Mesmo assim prometemos nunca acatar um humano. Mãe luna chora por sua causa. - Responde o lobo maior. - Agora vá embora daqui e não apareça mais em minha frente!

Assim o lobo menor sai pela mesma janela que havia entrado, tristonho.

- Menina, eu não lhe avisei para tomar cuidado? - Pergunta o lobo maior para a mãe da minha tataravó.

- Desculpas. - Responde ela. - Obrigado por ter nos salvado.

Ela então faz um carinho na cabeça dele e ele vai embora, como quem tivesse pago uma conta com alguém.

Sim, sei que muita gente já ouviu essa história em inúmeras versões, mas foi esta que sempre ouvi quando era pequena - e a que mais acredito. Tá! Lobos não falam, mas se você tiver lido As Crônicas de Nárnia, verá que é possível sim lobo falarem - ao menos em Nárnia.

De qualquer jeito, sei que foi assim e que várias outras histórias também não são da forma como sempre são contadas. Mas isso é conversa para outro dia.

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